Bioeconomia de fachada: o pirarucu amazônico enlatado fora da Amazônia

Opinião/Informação:

O Amazonas acaba de virar vitrine de mais um contrassenso. O primeiro pirarucu em lata do mundo é apresentado como símbolo de inovação, sustentabilidade e bioeconomia. O peixe é amazônico. O manejo é amazônico. O discurso é amazônico. A indústria, não. A lata é fechada longe daqui.

Esse detalhe, convenientemente ignorado, revela o que de fato acontece no Amazonas: produzimos matéria-prima, cedemos imagem, fornecemos o nome “Amazônia” como selo de marketing, enquanto o valor agregado, o emprego, a renda e a tecnologia ficam em outros estados. Isso não é bioeconomia. É a velha economia extrativista, repaginada com linguagem moderna.

Há anos o governo do Amazonas repete, quase como mantra, que aposta na bioindústria e na verticalização da produção. Mas quando surge um exemplo concreto, o que se vê é o oposto: um produto da sociobiodiversidade amazônica industrializado fora do território. Se nem o pirarucu — peixe símbolo, manejado, organizado e com cadeia estruturada — consegue ser beneficiado aqui, o que dizer dos demais produtos da floresta?

A responsabilidade não é do empreendedor que busca viabilidade onde ela existe. A culpa é do Estado omisso, incapaz de criar ambiente industrial mínimo para processar aquilo que é nosso. Faltam política industrial, crédito direcionado, segurança jurídica, logística planejada e articulação institucional. Sobra discurso.

Nesse cenário, a ADS – Agência de Desenvolvimento Sustentável do Amazonas precisa ser chamada à realidade. Desenvolvimento sustentável não se faz apenas com feira, evento, fotografia e programa de falsa vitrine como o PREME. A missão central deveria ser atrair indústrias, articular parcerias dentro e fora do país e garantir que os produtos amazônicos sejam beneficiados no próprio Amazonas.

Enquanto isso não acontecer, a tal bioeconomia continuará sendo retórica elegante para esconder incompetência estrutural. Continuaremos exportando peixe, castanha, açaí, borracha e histórias bonitas — e importando produtos acabados com o rótulo da Amazônia estampado.

O pirarucu em lata não é um avanço. É um alerta. Um aviso claro de que, sem decisão política e sem enfrentar interesses e inércias, o Amazonas seguirá especialista em perder oportunidades e em terceirizar seu próprio desenvolvimento.

THOMAZ RURAL

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