Agradeço ao Dr. Jorge Porto, do INPA, por comentar minha postagem sobre a PGPMBio

Opinião/Informação:

Que bom ter minha postagem levado o Dr. Jorge Porto, do INPA, servidor qualificado, fazer comentário em cima da minha opinião. Dr. Jorge Porto é um dos renomados pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), instituição referência mundial em estudos voltados para a biodiversidade, sustentabilidade e preservação do bioma amazônico. Com uma carreira sólida e marcada por importantes contribuições científicas, Dr. Porto dedica-se a compreender os complexos ecossistemas amazônicos, abordando temas como conservação, manejo de recursos naturais e o impacto das mudanças climáticas na floresta. Abaixo, na íntegra, o seu comentário, que me foi repassado pelo amigo Cristovam Luiz.

THOMAZ RURAL

“…A reflexão proposta por Thomaz Rural sobre a Política de Garantia de Preços Mínimos para Produtos da Sociobiodiversidade (PGPMBio) e o valor de R$ 9,33/kg para o pirarucu em 2025 levanta questões cruciais sobre a eficácia das políticas públicas voltadas à sustentabilidade, especialmente no impacto econômico sobre os extrativistas da Amazônia. O autor critica o preço fixado, argumentando que não cobre nem os custos de produção, colocando em risco a viabilidade econômica de atividades que são, ao mesmo tempo, essenciais para a preservação ambiental. Contudo, essa crítica, embora legítima, deve ser analisada à luz das complexidades econômicas e das limitações fiscais do governo, além de refletir sobre as alternativas possíveis para superar os desafios estruturais dessa política.

O Preço Mínimo e os Desafios Econômicos dos Extrativistas

O objetivo principal da política de preços mínimos é proteger os produtores contra as flutuações do mercado, que poderiam comprometer o manejo sustentável dos produtos da sociobiodiversidade. No entanto, o valor de R$ 9,33/kg, abaixo do custo de produção nos lagos marejados, estimado em R$ 12,00/kg, expõe uma lacuna significativa na implementação dessa política. Embora as críticas sejam válidas, é preciso considerar que o governo também enfrenta restrições orçamentárias, o que torna desafiador atender a todas as demandas do setor extrativista de maneira plena. As políticas públicas precisam buscar um equilíbrio entre os recursos limitados e as necessidades de desenvolvimento, sem desconsiderar as prioridades em áreas como educação e saúde.

Uma solução possível seria ajustar os preços de forma dinâmica, levando em conta o “custo Amazônia”, que envolve fatores como a distância para o mercado, a inflação, a sazonalidade das cheias e vazantes, e os períodos de defeso. Esse ajuste permitiria que as políticas de preços mínimos se mantivessem mais adequadas às realidades econômicas dos extrativistas, além de fornecer um mecanismo de adaptação à variabilidade do ecossistema amazônico.

A Bioeconomia e o Risco de uma Sustentabilidade Sem Viabilidade Econômica

Thomaz Rural aponta a “bioeconomia de fachada” como um dos maiores desafios enfrentados pelos extrativistas. De fato, sem uma viabilidade econômica real, a sustentabilidade se torna um discurso vazio, incapaz de garantir a permanência das práticas de manejo sustentável. O exemplo do pirarucu, que passou a ser manejado de forma sustentável graças ao conhecimento tradicional dos ribeirinhos e ao apoio das unidades de pesquisa na região, é uma ilustração de como a bioeconomia pode ser bem-sucedida quando acompanhada de incentivos adequados.

Contudo, esse avanço não ocorreu de forma imediata e nem sem desafios. Foi necessária a combinação de políticas públicas eficazes desde a década de 90, que permitiram aos pescadores manterem suas atividades de maneira rentável. A construção de uma bioeconomia verdadeira, portanto, exige um esforço contínuo de capacitação, investimentos e inovação. A sustentabilidade precisa ser vista não apenas como uma meta ambiental, mas também como um projeto de desenvolvimento econômico e social para as comunidades extrativistas. Vejam os vídeos e textos do IDS-Maniraua e os diversos relatos das comunidades ribeirinhas o quanto foi importante se manejar os pirarucus nos lagos e o quanto mudou as suas realidades para melhor.

O Papel das ONGs e a Necessidade de Maior Eficiência na Transferência de Recursos

O texto também critica a atuação de algumas ONGs, especialmente em relação à burocracia excessiva e à falta de recursos diretamente transferidos para as comunidades locais. Embora as ONGs desempenhem papéis importantes, como na capacitação e na construção de redes de comercialização, é fundamental que a transferência de recursos seja feita de maneira mais eficiente e transparente, sem depender de intermediários. A atuação dessas organizações precisa ser mais focada e integrada às reais necessidades das comunidades extrativistas, evitando a diluição de recursos em processos burocráticos.

Além disso, as ONGs podem ser mais eficazes ao atuar na criação de mercados mais acessíveis para os produtos da sociobiodiversidade, promovendo a certificação e o valor agregado desses produtos. A conscientização global sobre o consumo responsável e sustentável também é um fator chave para fortalecer a bioeconomia na Amazônia e garantir que os extrativistas tenham acesso a preços mais justos e competitivos.

Desigualdade no Acesso ao Crédito Rural e a Inclusão Econômica

A falta de acesso ao crédito rural é uma das falhas estruturais mais profundas nas políticas públicas de desenvolvimento regional. Dados recentes mostram que, enquanto o crédito rural destinado à soja foi de R$ 84,4 bilhões por ano entre 2021 e 2023, apenas R$ 1,4 bilhão foi canalizado para produtos da sociobiodiversidade e para a agricultura familiar . Essa disparidade evidencia a necessidade urgente de políticas públicas que garantam maior acesso ao crédito para os extrativistas, com condições que atendam às especificidades da produção sustentável na região.

Para enfrentar essa disparidade, seria crucial que o governo adotasse um sistema de crédito rural mais inclusivo, com taxas de juros reduzidas e linhas de financiamento específicas para a sociobiodiversidade, permitindo que os extrativistas possam investir na melhoria de suas atividades sem comprometer sua sustentabilidade financeira.

A Participação das Comunidades Locais na Definição das Políticas

A crítica de Thomaz Rural sobre a falta de participação efetiva das comunidades locais nas decisões políticas que afetam suas vidas é pertinente. As políticas públicas precisam ser mais inclusivas e refletir as necessidades e realidades locais. No entanto, a inclusão das comunidades na definição dessas políticas deve ser feita de maneira estruturada, respeitando a diversidade de interesses e garantindo que as decisões sejam tomadas de forma democrática, com a participação ativa dos extrativistas, das associações e cooperativas locais.

Além disso, a criação de fóruns regionais de consulta para a revisão das políticas de preços mínimos e outras iniciativas pode ser um caminho eficaz para garantir que as vozes das comunidades sejam ouvidas e que as políticas sejam ajustadas às condições locais. A participação não pode ser apenas formal, mas deve se traduzir em um processo real de decisão e adaptação às condições econômicas e ambientais da Amazônia.

Sustentabilidade como Inclusão Social e Justiça Econômica

Em última análise, a crítica de Thomaz Rural sobre o preço do pirarucu e a sustentabilidade no extrativismo é válida e precisa ser levada em consideração ao revisar as políticas públicas. Contudo, é fundamental que essas políticas integrem não apenas a preservação ambiental, mas também a inclusão econômica e a justiça social para os povos da Amazônia. A bioeconomia não pode ser tratada apenas como uma ferramenta ambiental, mas também como um instrumento para melhorar as condições de vida das comunidades extrativistas e promover seu desenvolvimento econômico.

As políticas públicas eficazes para a Amazônia devem garantir a justa distribuição dos recursos, promover o acesso ao crédito e fortalecer a bioeconomia com inovação e valor agregado aos produtos da sociobiodiversidade. Para que isso aconteça, é necessário que o governo, as ONGs e as próprias comunidades trabalhem de forma integrada, com transparência e um compromisso real com a sustentabilidade, não apenas no discurso, mas na prática diária do manejo sustentável…”

Dr. Jorge Porto/INPA

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